Memória

Relembrando Rosinha de Valença

Por Alberto Buaiz Leite - 29/07/2021

“Eu era uma mulher que precisava de sorte, porque era a única contra um número enorme de violonistas, um bando de homens que não estava a fim de me ceder um lugar. Precisava quase arrancar as cordas do violão, para que as pessoas compreendessem que eu sabia tocar.” Esta declaração é da violonista Rosinha de Valença, numa entrevista concedida ao Jornal do Brasil, em 1972, onde ela fala sobre a dificuldade de a mulher se projetar no meio musical. Mas isto não impediu que se tornasse, na sua época, a maior violonista do Brasil.
     Rosinha veio ao mundo como Maria Rosa Canelas. Nasceu em Valença, RJ, em 30 de julho de 1941. Começou a tocar aos 12 anos, acompanhando artistas na rádio de Valença e participando de um regional que animava os bailes, em sua cidade. Veio para o Rio de Janeiro, em 1963, e aqui se dedicou à carreira de instrumentista. Conheceu Sergio Porto e através dele começou a tocar no Bottle”S Bar, no Beco das Garrafas, e na boate Au Bon Gourmet. Sergio também a apresentou a Aloysio de Oliveira, diretor da gravadora Elenco e lá gravou seu primeiro disco “Apresentando Rosinha de Valença”, lançado em 1964.
     Sua trajetória artística desenvolveu-se de forma rápida. Continuou apresentado-se nas noites carioca e paulista, participou de programas de televisão, chegando a tocar com Baden Powell na TV Record e passou a acompanhar inúmeros artistas em suas gravações ou em seus espetáculos. Em 1965, durante oito meses, integrou o conjunto Sergio Mendes e Brasil 65, viajando com o grupo para os Estados Unidos. Lá, fizeram inúmeras apresentações e gravaram dois discos. Em 1967, acompanhou Maria Bethania no espetáculo “Comigo Me Desavim”. Nesta segunda metade da década de 1960, a convite do Itamaraty, a violonista fez temporadas no exterior, apresentando-se em mais de 20 países da Europa e África, e também no Japão. Chegou a apresentar-se com o guitarrista Stan Gets, a cantora Sarah Vaughan e o maestro Henry Mancini.
     De volta ao Brasil, em 1971, começou a trabalhar com Martinho da Vila, tornando-se sua parceira e atuando em quatro LPs do cantor. Participou de discos de vários outros artistas como Ney Matogrosso, Maria Bethania, Dona Yvone Lara, Leci Brandão, Caetano Veloso, entre outros, como instrumentista, ou como compositora. Continuou gravando discos solo ou em parcerias, como o álbum “Sivuca e Rosinha de Valença Ao Vivo”, em 1971 e “Violões Em Dois Estilos”, com o violonista Waltel Blanco, em 1980. Em 1983, gravou um LP independente chamado “Encontro das Águas”, com várias músicas de sua autoria. Em 1988, foi morar em Paris e, em 1989, gravou um disco, lançado pela RGE, na França, com o cantor Flavio Faria e participação de Toots Thielemans. Infelizmente esta trajetória musical foi interrompida , em 1992, quando a artista, em visita ao Rio de Janeiro, sofreu uma parada cardíaca e entrou em coma. Permaneceu em estado vegetativo, durante 12 anos e faleceu em 10 de junho de 2004.
Rosinha de Valença era muito querida, no meio artístico. Foram realizados alguns espetáculos beneficentes, contando com a participação de vários artistas, mesmo aqueles que não conviveram com ela, para ajudar no seu tratamento. No ano de sua morte, em sua homenagem, a gravadora Biscoito Fino lançou o CD “Namorando a Rosa” com produção de Maria Bethânia e Miúcha.
Neste mês de julho, Rosinha estaria completando 80 anos. O destino não permitiu esta comemoração, mas seu nome ficará, para sempre, na história da música instrumental brasileira. Foi a maior violonista que o Brasil já teve e merece ser lembrada com respeito e carinho.