Memória

Relembrando Dolores Duran

Por Alberto Buaiz Leite - 10/06/2020

     No dia 07 de junho de 1930, no bairro da Saúde, Rio de Janeiro, nasceu Adiléia Silva da Rocha. Teve vida curta, falecendo aos 29 anos. Mas, enquanto viveu, sempre foi uma mulher fascinante. Tornou-se artista e a música brasileira a conheceu como Dolores Duran.
     Desde criança, a menina gostava de cantar e, aos 10 anos, participou do programa de calouros de Ary Barroso, recebendo nota máxima. Quando tinha 12 anos, passou a atuar em rádio-teatro, na Tupy e, depois, em peças infantis, no Teatro Carlos Gomes. Aos 16 anos, enganando a idade, fez um teste na boate Vogue, em Copacabana, e foi contratada. Dolores Duran foi o nome artístico que adotou. Um dia, Cesar de Alencar a viu cantando e resolveu contratá-la, para seu programa, na Rádio Nacional.
Sua estreia em disco deu-se, em 1952, na gravadora Star, com a gravação de duas músicas para o Carnaval de 1953:
“Que Bom Será”, de Ailce Chaves, Salvador Miceli e Paulo Marques e “Já Não Interessa”, de Domicio Costa e Roberto Faissal. Em 1954, foi contratada pela gravadora Copacabana. Lá, gravou inúmeros 78RPM e LPs com seus grandes sucessos. No ano seguinte, compôs sua primeira música, “Se É Por Falta de Adeus”, em parceria com Tom Jobim e gravada por Doris Monteiro. Ainda neste ano, apresentou-se no Uruguai e casou-se com o radioator Macedo Neto. Em 1956, cantou na Argentina e, novamente, no Uruguai e, enquanto esteve no Brasil, integrou a Caravana Paulo Gracindo, apresentando-se em circos e praças, nos subúrbios cariocas.
Dolores gravou uma composição sua, pela primeira vez, em 1957. Foi a música “Por Causa de Você”, em parceria com Tom Jobim. Na verdade, a música já tinha uma letra de Vinicius de Moraes, mas quando a cantora ouviu Tom tocando-a, no piano, na Rádio Nacional, gostou da melodia e, ali mesmo, fez outra letra e entregou-lhe. Vinicius soube do fato, mas não criou problema, até porque gostava muito de Dolores, e cedeu a parceria para ela. Certa vez, o maestro afirmou que foi uma das melhores letras que já tinham feito para ele.
Em 1958, nossa homenageada voltou a compor com Jobim. Fizeram a canção “Estrada do Sol”, que fez grande sucesso e teve inúmeras regravações. Neste mesmo ano, viajou para a União Soviética, acompanhada de Nora Ney, Jorge Goulart, Paulo Moura, Conjunto Farroupilha e outros artistas. Era simpatizante do Partido Comunista Brasileiro, mas ficou desencantada com o regime soviético e, separando-se do grupo, foi para Paris, onde permaneceu algumas semanas. Após a volta ao Brasil, continuou sua carreira de sucesso, até o ano seguinte, compondo, gravando e fazendo apresentações, inclusive na TV.
Na noite de 23 de outubro de 1959, depois de uma apresentação na boate Little Club, a cantora saiu para beber, com pessoas amigas, como fazia normalmente. Foi para casa, com o dia claro e disse brincando para a empregada: “Não me acorde. Estou cansada. Hoje vou dormir até morrer”. Dormindo, teve um enfarte fulminante e faleceu, na madrugada de 24 de outubro de 1959.
Este mês, caso estivesse viva, Dolores estaria completando 90 anos. Ela sabia que sua vida seria curta. Aos 8 anos, teve uma febre reumática, que deixou sequelas, em seu coração. Por isso, viveu intensamente. Aproveitou todos os momentos de sua vida. Tanto no plano profissional, como no pessoal. Apesar de compor muitas músicas tristes, mostrando as dores do amor, era uma mulher alegre, risonha e amiga de todos. Era muito querida, no meio artístico. Adorava contar piadas e bater papo nos bares, onde o whisky, sempre, a acompanhava. A noite carioca era seu mundo. “Tinha uma disponibilidade para ser feliz e viver, como poucas pessoas”, afirma Rodrigo Faour, seu biógrafo.
Dolores compôs 35 músicas, mas foi a compositora brasileira mais gravada, pois foram centenas de regravações de sua obra. Ela só gravou sete de suas músicas. Foi gravada por grandes nomes como: Agostinho dos Santos, Sylvia Teles, Doris Monteiro, Cauby Peixoto, Elizeth Cardoso, Lucio Alves, Nana Caymmi, Elis Regina, Nara Leão, Milton Nascimento, Nelson Gonçalves e muitos outros. Gravou inúmeros sucessos como: “Castigo”, “A Noite do meu Bem” e “Fim de Caso”, apenas de sua autoria, as já citadas parcerias com Tom Jobim, “Ideias Erradas” com Ribamar, “A Banca do Distinto” de Billy Blanco, “Fia de Chico Brito” de Chico Anisio, “Canção da Volta” de Antonio Maria e Ismael Neto, entre outras. Há um detalhe curioso em sua biografia. Na sua época, foi mais famosa como cantora, e hoje, é mais lembrada e reconhecida como compositora, e não como a grande cantora que foi. Dolores Duran merece ser, sempre, reverenciada, pelo legado extraordinário que deixou para a música brasileira.