Memória

Ivon Curi: "chansonnier" tropical com trânsito livre no "divertissement"

Por Gerdal J. Paula - 18/07/2022

Como um Jean Sablon em miniatura e cantando, em 1939, do repertório do galante francês o nascente clássico "J`Attendrai", Ivo José Curi, caxambuense, ganhou, em sua cidade, um concurso de calouros. Contava, então, 11 anos de idade, revelando inequivocamente a veia artística que, do Circuito das Águas ao Rio de Janeiro (onde se fixou a partir de 1946), levá-lo-ia, já Ivon Curi, na antiga capital federal, à fama, que também pegaria pela palavra dois irmãos seus, mais velhos: os locutores Alberto Curi (noticiarista) e Jorge Curi (esportivo - antes dentista). Na Velhacap, inicialmente, após defender o próprio sustento no Laboratório Silva Araújo e na Panair do Brasil (nesta como vendedor de passagens), apresentou-se, pela primeira vez, às luzes da ribalta, em 1947, como "crooner", contratado por Caribé da Rocha para shows no Copacabana Palace, acompanhado pela orquestra do maestro Zaccarias. Um período em que, também no rádio - cantando na Nacional como convidado de programas em que cintilavam Marlene e Emilinha Borba, entre outras vozes do agrado popular -, a canção francesa de sucesso e verniz romântico ainda o amparava, destacando-se na interpretação aveludada da valsa "Pigalle" e do fox "C`est Si Bon". Um "chansonnier" tropical que, no entanto, na década seguinte, daria largas à sua comunicação com o público por outras vias de expressão: atuando em cinema e, na Atlântida, marcando um tipo na fase áurea da chanchada - janota, de ar aristocrático e chegado a trejeitos interpretativos -, além de, em sintonia de ondas curtas, dar uma guinada radical no repertório, redestinado, sobretudo, a ritmos nordestinos amplamente divulgados, como o xote e o baião.
No exterior, aonde, consequentemente, os bem-sucedidos passos artísticos em solo pátrio o conduziriam, teve especial acolhida em Lisboa, com casas cheias que lhe renderiam elepês, em 1957 e 1959, pela RCA Victor - "Eu em Portugal" (vols. 1 e 2), quando já se exercitava também como um "entertainer", fazendo mímica e contando piadas. Na Odeon, em 1963, esse quê chistoso daria um gás à produção de "Um Espetáculo À Parte", ao qual, naturalmente, não faltaria humor a músicas como "Amor Naquela Base", de Moura Jr. e Zé Araújo, e "O Felizardo", esta de um surpreendente Vicente Celestino. Parceiro do autor teatral Meira Guimarães em "Casar É Bom" e do discotecário Paulo Gesta em "O Chato" -, Ivon explorou o veio como um compositor de valor. A sós, no entanto, em outra vertente da inspiração, faria o seu "amendoim torradinho" - o belo samba-canção "Escuta" -, bem provado por Angela Maria e por ela bem servido em gravação sensível e de ampla difusão. Faleceu, em 24 de junho de 1995, aos 67 anos, tendo alegrado, por alguns anos, na década de 70, as noites cariocas com concorridos shows em casa própria, o restaurante-boate Sambão e Sinhá - na Rua Constante Ramos, em Copacabana -, no qual, além de atuar, recebia artistas convidados. Se chique despontou para o palco, chique também dele, em 1993, o inconfundível Ivon se despediu, em espetáculo intitulado "A França e 15 Saudades". Todas melodiosas, "bien sûr".
Pós-escrito: a) postagem minha feita há exatos cinco anos. Boa lembrança hoje trazida pelo Facebook, a qual aqui reproduzo; b) nos "links" seguintes, com exceção do quarto, Ivon Curi é ouvido em: "Bate-Papo Moderninho", dele; "Forró do Beliscão", de João do Vale, Ary Monteiro e Leôncio Tavares; "Foi num Trem", de Luiz Cláudio e Nazareno de Brito; "Escuta", de Ivon Curi, com Angela Maria; "Farinhada", de Zé Dantas; "Sob o Céu de Paris", versão de Oswaldo Quirino para a valsa "Sous le Ciel de Paris"; de Hubert Giraud e Jean Dréjac; c) foto: imdb.com

https://www.youtube.com/watch?v=RbRFuCc1TMo ("Bate-Papo Moderninho")
https://www.youtube.com/watch?v=UJq5bJ-9NSE ("Forró do Beliscão")
https://www.youtube.com/watch?v=Tw8htircQyU ("Foi num Trem")
https://www.youtube.com/watch?v=yKYBaWF9ROA ("Escuta")
https://www.youtube.com/watch?v=it6qFcNG8Q4 ("Farinhada")
https://www.youtube.com/watch?v=3SFf2IWeK5c ("Sob o Céu de Paris")