Especial

Quase 80 anos depois de sua morte, compositor Julio Reis volta pela mão da literatura

Por Luís Pimentel - 17/05/2012

Um “acerto de contas”, segundo o escritor Paulo Scott, na orelha do livro. Mas também uma declaração de amor a um avô e a um bisavô, a um Rio de Janeiro de começo do século passado, à música e à literatura.

Também uma reverência à relação filho-pai, “O inventário de Julio Reis” (Editora Record), do jornalista e escritor Fernando Molica, reabre as cortinas do passado para nos apresentar o compositor clássico Julio (Cesar do Lago) Reis, nascido em São Paulo (1863), que construiu família, carreira na música e no serviço público (foi funcionário do Senado), projeção e dissabores na então Capital Federal, onde viveu até sua morte, em 1933. Para quem não sabe (eu não sabia), Julio compôs “valsas, polcas, mazurcas, habaneras, quadrilhas, schottischs e tangos brasileiros”. Criou peças religiosas e até uma “Marcha triunfal”, executada em Roma nas comemorações do Jubileu do Papa Leão XIII.

Praticamente autodidata – só havia estudado música com a mãe, na infância – Julio contou, em vida e também depois de sua morte, com simpatias, aplausos, intrigas e até indiferenças. Em nome do pai, o filho do compositor da emblemática “Vigília d´armas” – que na esteira do lançamento da obra volta a ser executada até no Instituto Villa- Lobos, – Frederico, retoma o “acerto de contas” com a vida, a memória e a obra de Reis, e em defesa dela chega a enviar cartas para um general-presidente da República. Fizera uma caixa preta de madeira para guardar partituras manuscritas, livros e recortes de jornais, e lançou-se ao inventário da herança que, sem saber, estava legando ao seu neto.

Julio Reis era erudito, de enaltecer Carlos Gomes e Villa-Lobos e de torcer o nariz para os ritmos populares como o samba, o maxixe e os batuques que começam a embalar o Rio a partir do Estácio e da Praça Onze, “música fácil, que falava aos instintos mais baixos”. Em nome do avô, o acerto se impõe à história da criação musical e cai nas mãos de Fernando Molica, neto de Frederico, bisneto de Julio e um dos mais atentos escritores dos nossos dias (comprove lendo também “O ponto de partida” ou “Notícias do Mirandão”). O resultado é cativante, mas não vou contar. Só lendo o livro ou ouvindo as melodias.